ESTOU PERDIDO, DEVO PARAR? NÃO SE PÁRAS ESTÁS PERDIDO! Goethe

- ESTOU PERDIDO, DEVO PARAR? - NÃO, SE PÁRAS, ESTÁS PERDIDO! Goethe



segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Clube de Leitura

OS FILHOS DA MEIA - NOITE  -  SALMAN  RUSHDIE

O Clube de Leitura que aparece referido na banda direita desta página, é uma iniciativa que consiste em ter um livro à leitura, cada quatro semanas.
Se algum dos visitantes, tiver reflexões ou outros aportes sobre o livro na estante, está convidado a deixá-los em comentários, com a promessa de serem publicados como posts aqueles que apresentarem mais consistência.

O romance "Os filhos da meia noite", publicado originalmente em 1980, ganhou no ano seguinte o conceituado prémio de literatura em línga inglesa "Booker Prize". Em 1993, foi premiado com o título "Booker of Bookers Prize", conferido ao melhor livro publicado nos primeiros vinte e cinco anos deste prémio, tendo reeditado em 2008 o galardão, de Booker dos primeiros 40 anos.
A história da Índia moderna, a partir de sua independência em 15 agosto de 1947, é a base do romance de Salman Rushdie que utiliza como fio condutor a troca de dois bebés, um de família hindu e outro de origem muçulmana, nascidos exatamente à meia-noite. Uma das crianças, Salim Sinai, o hindu pobre criado por engano numa rica família muçulmana, é o narrador do romance.
A trajetória de Salim Sinai começa, para ser exato, em Caxemira durante a primavera de 1915 quando seu avô, o jovem e recém-diplomado dr. Aadam Aziz, bate com o nariz em um montículo de terra endurecida pela neve durante as suas orações: "Três gotas de sangue saltaram de sua narina esquerda, endureceram instantaneamente no ar gelado e caíram, diante de seus olhos, transformadas em rubis, sobre o tapete de oração. Jogando o corpo para trás, até ficar com a cabeça novamente ereta, ele percebeu que as lágrimas que lhe haviam surgido nos olhos também tinham se solidificado; e naquele momento, enquanto desdenhosamente afastava os diamantes dos cílios, ele decidiu que nunca mais voltaria a beijar a terra por nenhum deus ou homem. Essa resolução, criou um buraco dentro dele, um vazio numa câmara vital interna, deixando-o vulnerável às mulheres e à história."

O romance "Os filhos da meia-noite", de Salman Rushdie, sobre a independência da Índia, está ser adaptado para cinema pela realizadora Deepa Mehta.
O argumento é escrito pelo próprio Rushdie em colaboração com a realizadora, nascida na Índia e naturalizada canadiana.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Sócrates em dia de greve!



      O HOMEM INVISÍVEL!

Há quem lhe chame outra coisa!

Conversa de café!



Tenho andado aturdido (ou azonzado, como diz o meu filho!) sobre a bipolaridade do discurso público em Portugal.

A queirosiana perspetiva "da choldra", tem-se vindo ultimamente a impor no discurso crítico dominante, em variadas versões, algumas muito lúcidas e vai sempre desaguar na solução de sempre - nada se resolverá enquanto não vier alguém de fora pôr mão nisto!
De acordo com esta visão, com mais de cem anos de tradição, este grupo de Iberos é ingovernável ( "não se governa, nem se deixa governar"*), é responsável pela sua própria desgraça e nada fará para sair dela (ainda ontem em artigo do Le Monde, se vaticinava que os portugueses caminham inexoravelmente para a pobreza coletiva).

Por contraposição existe uma tese desculpabilizante que atira para "os Outros" a responsabilidade dos nossos males - seja a crise internacional, a globalização desenfreada, os mercados soberanos, a Alemanha ou o FMI. Nesta leitura da realidade, somos sempre vítimas de campanhas conspirativas, pelo que nada podemos fazer, nem nos devemos preocupar com o assunto, porque o "Outro" é que terá de o fazer.
Nesta corrente de pensamento, muito antes de Boaventura Sousa Santos, foi mestre um bêbado da minha aldeia, de apelido sugestivo "O Fadista", que se endividava para além do passível de ser algum dia saldado, para fundamentalmente beber e jogar, em pose de grande senhor, no Casino. E quando se lhe perguntava se isso não lhe tirava o sono, respondia o Fadista: "Eu durmo bem e satisfeito que até levo uma boa vida! O que me custa a perceber é como os gajos que me emprestam o dinheiro, conseguem dormir!"
(A história é verídica e o Fadista morreu atropelado numa berma de estrada numa noite de maior felicidade, deixando um imensidão de financiadores frustrados e sete filhos sem ter de comer!).

O discurso oficial tem oscilado entre as duas versões, no seu situa"cinismo" cada vez menos convincente, mostrando-se incapaz de definir um rumo político para o País e resumindo o seu objetivo ao tentar manter-se à superfície! Convém lembrar que os mortos, quando começam a decompor-se também flutuam, sem que isso signifique nada de bom!

Ora do meu ponto de vista ambos os discursos têm aspetos corretos e estaríamos na altura de fazermos uma síntese de superação do dilema.

 Se uma instituição bancária abre falência seja por erros de investimento, fraude ou consequência de especulação desenfreada, não compete ao Estado, em nome de todos nós, ir a correr salvar o moribundo - apenas lhe compete honrar as suas obrigações legais, isto é, accionar e cobrir as garantias dos depósitos e gerir o processo de falência!
Se foram os bancos alemães ou franceses ou ingleses que vão ficar a perder, tanto pior para eles, que fizeram aplicações que se revelaram pouco assisadas! Agora endividar-nos a nós todos, para salvar o sistema financeiro do "risco de contágio" (mito por demonstrar que tem dado cobertura a todos os desvarios) e depois ir mendigar a esse mesmo sistema que nos financie o dia a dia, isso não!

Culpar os especuladores internacionais dos juros insustentáveis da dívida, sem que se consiga inverter a situação de dependência quotidiana da nossa economia, lembra-me o toxicodependente que em vez de deixar o vício, insulta o traficante por aumentar os preços da dose. E também nesse caso não falta quem desculpabilize o drogado - pelos problemas de infância, o contexto social ou psicológico, porque é um doente ... e que deveria ter acesso a doses gratuitas em salas de chuto decentes.

Só sairemos deste ciclo vicioso se formos capazes de mudar de vida, adaptando os nossos padrões de consumo às nossas possibilidades!
Só negociaremos com os nossos credores de cabeça levantada se soubermos que cada vez menos dependeremos deles!

O que se passa infelizmente está muito longe disto - e execução orçamental deste ano mantém o mesmo nível de despesa do ano anterior, apesar dos PECs, das ameaças e dos compromissos. Continua-se à espera de resolver o problema à custa de receitas extraordinárias - só que quando acabarem os anéis, começam a ir os dedos. E já estamos perto das amputações.

Competiria aos lideres, não só por questões de exemplo moral mas porque de fato estão nas suas mãos as decisões mais difíceis e importantes, passarem a não transigir com qualquer despesa que não se revele essencial, mesmo quando isso contrarie hábitos e ideias feitas!
E esperar que por evidência esta atitude contamine os cidadãos, quando finalmente estes perceberem duas coisas - que a situação é de facto insustentável e que depende de nós a sua solução (contrariando as duas correntes de racionalização conhecidas: a que desculpabiliza os portugueses - "a culpa é dos outros" - e a que acha que só alguém de fora vai endireitar isto - "porque isto é uma choldra"!

Advogo pois uma terceira via, a da responsabilidade e da dignidade, uma verdadeira revolução cultural!
Isto implica que todos se sintam mobilizados para discutir os assuntos públicos como seus - que nos preocupem mais as finanças públicas, que o enredo das novelas, que sejamos tão intolerantes com os políticos que erram ou roubam, como somos com os treinadores que não conduzem o nosso clube à vitória, que houvessem multidões a acenar lenços brancos numa visita de um ministro que não atingisse os objetivos propostos, que se entrasse num café e se ouvissem acaloradas discussões sobre a execução orçamental ...

Será isto possível? Possível é ...!
Ficaremos mesmo mais pobres?, haverá fome?, insegurança pública?, perda da independência?, retrocesso civilizacional?  É mesmo muito possível!

________________________________________________________________
*«Há, na parte mais ocidental da Ibéria, um povo muito estranho: não se governa nem se deixa governar!» - escrito no séc. I ou II a. C. por um general romano em serviço na Ibéria, em carta enviada ao Imperador. A autoria da frase passou mais tarde a ser atribuída a Caio Júlio César.

Porque é demasiado belo para se perder!



Encontrará aqui 47 fotografias do Concurso Anual da National Geographic, que só por si valem o dia!
De lá poderá aceder ao site da NG para votar até 30 de Novembro!

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

VIDA INACABADA



Filme de 2005 de Lasse Hallström, realizador sueco que tendo começado por produzir videoclips para os Abba, é hoje um dos mais bem sucedidos de Hollywood ("Chocolat", "Shipping News", "Casanova", "Cider House Rules/Regras da casa", tendo dirigido recentemente Richard Gere - "The Hoax"(2007), "Hachico"(2009)).
Neste filme com Robert Redford (nasc.1936), Morgan Freeman (nasc. 1937) e Jennifer Lopez (nasc. 1969), aborda a questão da perda, da culpa e da dificuldade de as ultrapassar.
Robert Redford um veterano com 64 presenças como ator e 8 títulos como realizador (foi óscar de melhor realizador, logo no primeiro - "Gente Vulgar"- em 1980), assume aqui  o ideal de uma América rural, políticamente incorreta, de gente crua mas humana, na senda de Clint Eastwood (nasc.1930, 66 presenças como ator e 35 filmes realizados desde 1990),  a que cada vez mais se assemelha.
Morgan Freeman (89 filmes), contemporâneo de Redford, assume com este uma relação muito idêntica à que tem com Clint Eastwood em Million Dollar Baby (2004) - é o elemento humanizador, capaz de vergar a personalidade difícil do durão desencantado com a vida, de convocar pela sua frontalidade e fraternidade,  a alma sensível que se esconde atrás dum carácter aparentemente inacessível. Aliás também o faz em "The Bucket List/Nunca é Tarde Demais" (2007), com Jack Nicholson, outro insuportável ego, que aceita que Freeman o redima, obrigando-o a acertar as contas com a vida.
Têm todos estes três filmes muito de comum - três personalidades fortes, de herói americano clássico (Marlboro Man assumido no caso de Redford neste filme), indiferentes ao que os outros possam achar das suas vidas, mas todos eles com questões por resolver e a quem a personagem de Morgam, simples, tolerante, capaz de perdoar, aparece como anjo redentor, conseguindo quase anónimamente trazê-los à razão e põ-los de bem com os outros e consigo próprios.

Eu que tenho um fraco por corações empedernidos e acredito em anjos da guarda, gosto de ver estes filmes num domingo à tarde e deixar-me emocionar.
Quem dera o mundo fosse assim, de gente difícil, mas curial, passível de se regenerar ...

domingo, 21 de novembro de 2010

NYCO - Perto da Perfeição



The NYCO is:  Marty Ehrlich (reeds), Doug Wieselman (reeds), Briggan Krauss (alto sax), Douglas Yates (reeds), Andy Laster (bari sax), Riley Mulherkar (trumpet), Zubin Hensler (trumpet), Ron Horton (trumpet), Chris Stover(trombone), Andy Clausen (trombone), Mark Taylor (french horn), Robin Holcomb (piano, conductor),Wayne Horvitz (piano, conductor), Lindsey Horner (bass), and Bobby Previte (drums).

Ensemble formado em 1986, com apenas dois registos publicados (1990,1992) a New York Composers Orchestra, reuniu-se de novo para celebrar o seu 25º Aniversário, para um concerto duplo em New York (26 Outubro de 2010), tendo vindo ontem encerrar o Guimarães Jazz 2010.
Integrando a quase totalidade dos seus fundadores, este coletivo de 13+2 elementos (Robin Holcomb e Wayne Horvitz - foto e principal mentor- na direção), fechou de forma memorável o festival.
Trata-se de um conjunto de músicos maduros, excelentes intérpretes, confortáveis em variados registos estilísticos, que sobre as peças escritas interpretadas, mantiveram uma dinâmica improvisadora coerente, adequada, sem excessos exibicionistas.
Com um som a remeter tanto para as suites de metais de Stravinsky, como para  Ellinghton ou Mingus, sem abdicar de evocar toda a história do Jazz (pareceu-me ouvir até Sun Ra), resultou uma estética final comporânea e culta, onde porém a emoção continua a ter o seu lugar.
Alternando momentos de orquestra de câmara erudita, com celebrações free, o duo rítmico de Lindsey Horner e Bobby Previte, manteve sempre uma linha condutora bem sinalizada, sem qualquer risco para o público se perder.
Jazz intelectual, branco (um negro em quinze), urbano down town, académico, mas sem ser pretensioso, frio ou amnésico.
Música a assumir todo o passado e a revelar muito do futuro.
Música perto da perfeição!

(A Orquestra de Jazz do ESMAE, que tocou à tarde, a apresentar o resultado dum trabalho de uma semana, com os jovens músicos do grupo também novaiorquino The Story, soou muito agradávelmente e garantindo a esperança dum futuro rico para o Jazz em Portugal. Mas também ajudou, ao servir de referência, a perceber que a NYCO, está num plano incomparável, a que talvez um ou outro destes jovens possa um dia ambicionar aceder!)

(Mais tarde ainda houve jam session, com the Story e ..., e festa de encerramento! Um festival é mais do que uma soma de concertos - e em Guimarães notava-se uma mobilização da cidade em torno do evento (nos bares, restaurantes, salas de exposições, turismo). Um bom exemplo!)

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Olhe-se para o que fazem, não para o que dizem!


Jean Jacques Rousseau nasceu em Genebra, Suíça, em 1712.

Filho de protestantes, perdeu a mãe durante o parto. Aos 10 anos, foi entregue pelo pai a um tio, que por sua vez, o entregou a um padre, com o qual, teve uma infância infeliz.
Na adolescência, após um breve período de vagabundagem, entrou num reformatório em Turim. Em seguida tentou, por várias vezes, ser acolhido num seminário. Frustrado com as repetidas recusas, saiu da Suíça em 1730 e foi para França, onde se estabeleceu em Paris, no ano de 1742.

Na cidade conheceu Denis Diderot e tornou-se um dos muitos colaboradores da Encyclopédie. Rousseau ainda escreveu alguns artigos sobre a música, sua grande paixão, mas com a publicação do seu romance "Émile ou de l'éducation" (1762) entrou em conflito com as autoridades francesas, razão pela qual fugiu para Inglaterra em 1766. Um ano depois retornou à França protegido por um nome falso.

Em 1768, casou-se com Thérèse Levasseur, sua amada de longa data, com quem teve cinco filhos, todos entregues à adoção, devido à situação financeira do casal.
Morreu em 2 de julho de 1778, em França. Entre suas obras, as escritas em 1762, "O Emílio ou da Educação" e o "Contrato Social", são as que apresentam maior conteúdo pedagógico.

Em "Emílio", espécie de tratado pedagógico sobre a forma de novela, Rousseau explana um método educativo ideal que deveria ser seguido na educação de uma criança. As suas ideias foram reabilitadas durante a Revolução Francesa e inspiraram o sistema educativo então implementado. Rousseau foi durante a revolução homenageado com o translado dos seus ossos para o Panteão de Paris.
As ideias pedagógicas de Rousseau, que estão na origem do pensamento iluminista e moderno de educação, assentam no princípio que o Homem é na sua origem puro e intrinsecamente bom e é a sociedade que o corrompe.

"Emílio" está dividido em cinco livros: o primeiro, aborda o período da educação do nascimento aos cinco anos, defendendo que a sua ama o deverá amamentar e tudo fazer para não contrariar a natureza do pequeno ser; o segundo, debruça-se sobre a infância (5 aos 12 anos), realçando que a aprendizagem não se deve fazer pelos livros, mas assentando na exploração dos
sentidos e promovendo um sistema dedutivo espontâneo, que não condicione a pulsão natural; o terceiro livro, sobre a adolescência (12 aos 15 anos) incide sobre a escolha de uma profissão, que entende deve ser manual, para não deixar o intelecto submergir o natural; o quarto livro, sobre a puberdade, aborda as questões do amor e da fé e foi o que esteve na origem das principais controvérsias, que levaram à proibição e queima dos seus livros em França e na Suiça. O quinto livro aborda a educação de Sofia, a “mulher ideal” e futura esposa de Emílio e a vida doméstica e civil deste.

Sendo J.J.Rousseau, um intelectual e incapaz de criar qualquer um dos seus cinco filhos, como se tornou o fundador da moderna pedagogia ocidental, enaltecedora de um homem "natural", não condicionado pelos livros e pelas ideias?

Foi nesta preversão original que entroncaram muitos dos mal entendidos contemporâneos!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Para refletir!



Do artigo do jornal Público de 5 de Junho de 2010:
"Primeira grande surpresa do relatório anual de Avaliação da Actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), que na próxima segunda-feira será apresentado nos Açores: um em cada cinco menores com processo instaurado é estrangeiro.
Segunda grande surpresa: o ano fechou com mais duas mil crianças retiradas às famílias do que em 2008. Mais precisamente, 2724 menores foram encaminhados para instituições (2510) ou para acolhimento familiar (214). Bem mais do que em 2008, ano em que apenas 701 foram forçados a deixar quem não os protegia: 625 para instituições e 75 para famílias de acolhimento.
O volume processual global alcançou o valor mais alto de sempre: 66.896."
(Comentário: um aumento de retiradas de quase 400% num ano!)

Da reportagem do i de 31 de Agosto de 2010:
"Cavaco Silva fez ontem a primeira visita oficial ao Refúgio Aboim Ascensão, em Faro. Reconhece que o modelo de emergência infantil que o centro lançou há 25 anos talvez seja demasiado pesado para as finanças do país.
Historicamente, defende Villas-Boas, “o que temos é este modelo criado há 25 anos e o que o dominou sempre, de internar crianças entre quatro paredes até aos 18 anos”.
A visão de Cavaco Silva contraria o balanço positivo do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, no relatório anual sobre os jovens em instituições de acolhimento divulgado em Abril.
Segundo o último protocolo de cooperação, assinado em 2009 entre a CNIS, a União das Misericórdias Portuguesas e a União das Mutualidades, com um reforço de 12% em relação aos montantes de 2008, prevê a comparticipação financeira de 469,11 euros por utente/mês nos Lares de Crianças Jovens – cerca de 36 milhões de euros por ano quando multiplicado pelas 10 mil crianças no sistema."
(Comentário - um ordenado mínimo por menor institucionalizado! A maior parte das famílias de onde provêm estes menores não terão o mesmo para vários elementos!)
 
De notícia do Público de 6 de Setembro de 2010:
"Nos primeiros oito meses do ano, a Brigada de Investigação e Averiguação de Desaparecidos da Polícia Judiciária recebeu 856 queixas, a maioria das quais (623) relativa a adolescentes com mais de 12 e menos de 18 anos, revelou à Lusa Ramos Caniço, director da Unidade de Informação e de Investigação Criminal.
Ramos Caniço destacou o facto de 478 das participações de adolescentes desaparecidos se referirem a jovens institucionalizados, que desaparecem várias vezes por ano dos centros educativos e citou o caso de um menor que fugiu 27 vezes de um centro."
Comentário: 75% das fugas de jovens provêm de um universo restrito de alguns milhares institucionalizados. Isto será indicativo do grau de satisfação das crianças institucionalizadas?"

De artigo do Diário de Notícias de 12 de Outubro de 2010:
"Só no ano passado, os pais sinalizaram às comissões 2342 situações de filhos em risco."
“Os pais vêm pedir para ficarmos com os miúdos porque sentem que a única solução é o seu acolhimento. Se a criança tem mais de 12 anos e se opõe, o internamento tem de ser decretado pelo tribunal”, acrescenta António Fialho, juiz do Tribunal de Menores do Barreiro. “Estas crianças não praticaram crimes para necessitar de internamento no sistema tutelar educativo mas encontram-se em risco. São causadoras do seu próprio risco. São marginais e os pais pedem ajuda para resolver o problema, entregando-os.”
Comentário: Os pais entregam ao Estado os filhos para este cuidar deles. São estes os verdadeiros filhos de Rousseau?

Saiba dizer não!



A maioria das pessoas, quando se trata de Cuidados de Saúde, pensa que mais cuidados, significam melhores cuidados, mas muitos estudos provam justamente o contrário!
De acordo com este artigo no The New York Times (Leonhardt D, April 6, 2010),  quando mais, significa exames e tratamentos desnecessários, novos riscos surgem para os doentes, com consequências na sua saúde, isto para além da escalada insustentável de custos do Sistema de Saúde.
O artigo, que se recomenda na íntegra (link acima), cita um estudo recente que calcula em 15000, o número de mortes desnecessárias resultantes da exposição anual à radiação pelos TACs realizados nos Estados Unidos, dado o acesso fácil a este exame, para esclarecer qualquer sintoma ligeiro ou dor passageira.
Para o sucesso de qualquer sistema de saúde, advoga que a cultura "do fazer tudo e mais alguma coisa" tem que acabar, embora reconheça que é mais fácil dizer que fazer.
Apresenta 3 sugestões para esse objetivo ("mais cuidados não são melhores cuidados"!) -
1) refletir mais acerca de quando e como uma investigação e um tratamento trazem benefício para o doente;
2) fornecer aos doentes, informação realista acerca dos tratamentos;
3) orientar a avaliação económica da Medicina para indicadores de melhores cuidados, em vez da contabilização da quantidade de cuidados!
Sugere ainda que deverão ser os doentes, a impor limites nos exames e tratamentos a que serão sujeitos, pois são eles os verdadeiros interessados e se deixarem nas mãos dos médicos e da indústria farmacêutica, tal nunca acontecerá!

Quanto a este último aspeto, tenho sérias reservas, pelo menos no nosso contexto social e cultural!
Se não forem os profissionais de saúde a autodisciplinarem o consumismo médico, estou convencido que este continuará a aumentar entre nós, já que muitas vezes funciona mesmo como compensação de frustrações de natureza económica e mesmo emocional de muitos utentes (entendido num contexto de acesso universal!)
Isto para além de que a cultura "do fazer tudo e mais alguma coisa" é de facto popular entre nós, embora não tenha sido sempre assim!
Um bom exemplo é o da taxa de cesarianas em Portugal , em crescimento imparável, que já apresenta valores acima dos 35%, embora haja maternidades com taxas de 80% (sic Ministra da Saúde). A média europeia andará ligeiramente acima dos 20%, mas a mais contida Holanda tem um valor de 15%.
Uma cesariana é um parto que em circunstâncias normais é prejudicial quer para a mãe, quer para o recem nascido, implica uma logística e custos incomparavelmente mais altos que um parto normal (bloco operatório, dias de internamento), mas em torno do qual se desenvolveu um mito popular de que é menos cruento, mais seguro, mais cómodo!
Os médicos, pressionados pelas utentes e por razões defensivas, sentem-se muitas vezes encurralados nessa opção. (É ingénua a convicção do Grupo para a Redução da taxa de Cesarianas, de que divulgando os números das diferentes unidades hospitalares, as pessoas escolherão as que apresentem valores mais baixos. Correm o risco, penso eu, que aconteça precisamente o contrário...).
Numa altura, em que a evolução tecnológica disponibiliza um número cada vez mais específico e dispendioso de técnicas (nomeadamente na área da imunologia e da genética) e de terapêuticas (um novo antiepilético recentemente comercializado custa 10 vezes mais que os medicamentos que vem substituir e foi comparticipado a 100%(???)), com vantagens às vezes marginais, impõe-se refletir sobre o assunto, cativar profissionais e utentes para esta realidade, de forma a ser sustentável o nosso sistema de saúde, uma das poucas áreas em que nos podemos comparar internacionalmente sem complexos!

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A feijões todos podem ser, mas ninguém quer!






A CPCJ - Comissão de Proteção de Crianças e Jovens, é um organismo participado pelas autarquias, Ministério da Saúde, Educação, Segurança Social, forças policiais, que desempenha funções numa área tão sensível, como a das crianças vítimas de negligência, maus tratos, abandono.
Tem poderes executivos, podendo promover a retirada de crianças dos pais e  a sua institucionalização e requerer a intervenção do Ministério Público quando a necessidade de intervenção ultrapassar a sua competência.
Os seus elementos são em regra técnicos das Autarquias ou da Segurança Social(assistentes sociais e psicólogos), destacados para essa função.
Deparando-se com casos complexos, sentindo uma pressão social e dos media crescente e tratando-se muitas vezes de pessoas com pouca experiência profissional e de vida, estão na origem de uma taxa de institucionalização de crianças que põe Portugal no topo do mundo ocidental.
Já me bati contra a retirada de crianças da sua família, por terem sido espancadas pela mãe, embora considere esse comportamento ignóbil. Mas entendo que retirá-las à sua família, que não é só a mãe, são irmãos, primos, avós, ao seu bairro, aos seus colegas e amigos e colocá-la à proteção de funcionários de instituições por mais zelosas que sejam, é uma forma de violência muito mais grave e traumatizante que as surras, excepto se estiver em causa um risco de vida ou de lesões incapacitantes.
Já me bati, contra a retirada de recém nascidos aos seus pais, por estes não terem as competências sociais, culturais e económicas consideradas adequadas para os criarem, porque entendo que a promoção da orfandade, nem sempre será melhor que uma família incompetente.
Já me interroguei sobre este negócio emergente dos lares e casas refúgio, subsidiadas pelo Estado e se não distorceriam pelos seus interesses, a visão social que temos do assunto.
Já, como adivinham, fui olhado de soslaio e questionado por estas dúvidas num ambiente dominado pelo politicamente correto, a cargo de profissionais cheios de certezas.
Com isto não quero ignorar que são geralmente decisões difíceis, que envolvem riscos, que hoje ninguém parece querer correr, nem tolerar, o que leva em regra, a excessos de zelo preventivos, sem se considerar os malefícios que daí decorrem.

E é por que tudo isto mexe com vidas, que se deveria apostar em dotar cada vez mais as CPCJ de pessoas experientes, competentes e de bom senso.
Mas não - em fase de contenção de recursos, as entidades integrantes das CPCJ, começam a não estar disponíveis para cedência de técnicos e começa a adivinhar-se o seu desmembramento.
No caso concreto do Distrito de Viana do Castelo, a Câmara em comunicado de 26/10/10, retira a cedência dos seus técnicos à estrutura, pois no caso da Presidência da Comissão implicava o exercício de funções a tempo inteiro.
Em reunião ordinária da CPCJ de 27/10/10 da CPCJ, demite-se a sua Presidente e não havendo solução à vista foi proposto que qualquer elemento da Comissão Alargada (isto é representantes da Assembleia Municipal, das forças policiais,das associações de pais, etc.), que se disponibilizasse passaria a exercer a Presidência da CPCJ, sem mais delongas. E felizmente, nem assim!
É de bradar aos céus - então tanta intransigência, tanto espírito de missão, tanta elevação social, moral e ética, dá nisto!
Qualquer pessoa, independentemente da sua competência e perfil, serve?

A crise começa a mostrar o que virá aí!

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Cada vez menos e mais frágeis!



Existirá um inconsciente coletivo?
Este trilho que sulcamos é inconsciente ou deliberado?

Já não bastava a realidade de nascermos cada vez menos neste país, a ponto de termos entrado em regressão populacional, como dei nota há tempos, como nascemos cada vez mais desprotegidos e dependentes!
Refiro-me ao aspeto biológico, embora case bem com a vertente sociológica e económica.

Agência Lusa, hoje: Taxa de nascimento prematuro é das mais altas da Europa
Quase nove em cada 100 bebés em Portugal nascem prematuramente, uma taxa que se situa acima da média europeia, segundo dados avançados pela agência Lusa que citam a responsável do serviço de neonatologia da Maternidade Alfredo da Costa, Teresa Tomé. O Norte do país apresenta uma taxa de prematuridade superior à média nacional.

À nascença o português contemporâneo, além de uma dívida congénita, também tem tempo em falta e deficite de maturidade!
Com um handicap destes à partida, estamos mesmo condenados!
O último a nascer, que feche a porta!

domingo, 14 de novembro de 2010

Meditações em Bad Trip


Diz o press release, profusamente difundido: "Esta formação reúne três dos maiores saxofonistas vivos da cena jazzística mundial: Joe Lovano, Dave Liebman e Ravi Coltrane". Já mais difícil era saber que estariam em palco com Phil Marcowitz (piano), Cecil McBeee (baixo) e Billy Hart (bateria), uma secção rítmica (e mais que isso) de sonho.
Uma sala excelente (Centro Cultural Vila Flor - Guimarães), inserido num festival com uma ótima tradição de música e público.

O concerto foi uma suite em 4 ou 5 andamentos, tocada sem pausas, ao longo de 90 minutos, em torno das "Meditations Suits" de John Coltrane.
A minha impressão é que se tratou do maior desperdício de talentos de que tenho memória ter assistido.
Fruto de uma obsessão ideológico-conceptual, que retirou toda a espontaniedade aos músicos e impediu a interação criativa do coletivo, presenciamos uma música sofrida, em tom de requiem free-jazz, talvez em memória às bad trips de Coltrane na sua última fase (de onde datam as First Meditations-1965 e Meditations-1966) numa altura em que juntou o consumo de LSD ao da heroína, drogas que atormentaram os últimos anos do músico que viria a falecer em 1967 com 40 anos.
O que apesar de tudo em Coltrane era excesso, espontaniedade e recusa de regras, aqui soou a excesso de regras e formatação, em ambiente de velório de Centro Cultural.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A raparigada



Em homenagem à cultura e idade do seu autor (80 velas) e por ter a liberdade de dizer o que eu não teria coragem!

TEMPO CONTADO: A raparigada

É o mesmo que em 1984, tinha a lucidez de escrever isto!

Mario Vargas LLosa



Mario Vargas Llosa, o meu autor deste mês, nasceu em Arequipa, a cidade branca, em 1936.
"Tia Júlia e o Escrevedor", o livro que me entretém de momento, foi publicado em 1977 e relata autobiograficamente o que foi a sua vida e o seu pensamento por volta dos seus 18 anos. Namorava então a sua tia Júlia (melhor dizendo a irmã de uma sua tia), com quem efetivamente veio a casar aos 19 anos e ganhava a vida como jornalista numa rádio de Lima, enquanto estudava Letras e Direito na Universidad Nacional Mayor de San Marcos.
Detenho-me no capítulo IX onde Marito confidencia à sua prima Nancy, a sua paixão pela irmã da tia Olga, Julia. A sua prima tenta chamá-lo à razão, alertando-o para o escândalo, recordando-lhe que "a família tinha ilusões, era a esperança da tribo." "Era verdade, a minha parentela cancerosa esperava de mim que fosse um dia milionário, ou no pior dos casos, presidente da República".
" Se te casares com ela, dentro de vinte anos, ainda és jovem e ela uma avozinha", recorda-lhe Nancy, sugerindo que do que ele precisava era de alguém como ela.  Júlia já lhe tinha, aliás, dito "Na melhor das hipóteses, o nosso caso duraria três anos, talvez uns quatro, quer dizer, até encontrares a miúda que vai ser a mamã dos teus filhos."

Ora isto não é um romance, é um oráculo.
Com vinte e oito anos, Mário divorcia-se de Júlia e um ano depois, casa-se com a sua prima Patrícia Llosa, sobrinha da sua primeira mulher e com quem vem a ter 3 filhos.
Em 1990 concorre à Presidência da Republica do Perú, pela Frente Democrata, perdendo para Alberto Fujimori.
Vinte anos depois em 2010 recebe o prémio Nobel da Literatura, que para além da consagração, vale para cima de 1 000 000 de Euros.
Cumpre-se assim a vontade da "parentela cancerosa" - o Marito, torna-se milionário, já que embora tenha tentado, não conseguira ser Presidente da República.



Aqui Vargas Llosa, aparece ao lado de sua mulher, Julia Urquidi  (à sua direita), que viria em 1983 a publicar a sua réplica à Tia Júlia e o Escrevedor, em "O que Varguitas não disse".
A fotografia é de 1959, tendo "Marito" portanto 23 anos e não aparentando ter menos 11 anos que Julia. É caso para dizer parafraseando o seu alter ego novelístico, Pedro Camacho, que ainda estava muito longe daquela idade que a ciência considera ser a do apogeu de um homem - os 50 anos.
Em foto de 1959, Vargas Llosa aparece ao lado da mulher Julia Urquidi (à direita) e da jornalista guatemalteca Maria Cristina Orive


segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Cuy




 







O Sr. Federico Téllez Unzategui, "estava na flor da idade, nos cinquenta e os seus sinais particulares - fronte larga, nariz aquilino, olhar penetrante, retidão e bondade de espírito", tinham-lhe permitido atingir o sucesso à frente da firma Anti-Roedores, S.A..  
Embora nada faça crer que conhecesse a Drª Lucía Acémila ("mulher superior e sem complexos, chegada ao que a ciência deu em considerar a idade ideal - os cinquenta - apresentava fronte larga, nariz aquilino, olhar penetrante, retidão e bondade de espírito"), tinha superado os traumas de uma infância difícil, seguindo intuitivamente o método que tanta fama viria a dar a esta facultativa - não havia vantagem em superar as preversões e os complexos, bastava assumi-los e fazer disso uma vantagem.
E assim Federico Téllez Unzategui, com uma vida potencialmente destruída pela culpa associada a um episódio da sua infância (a morte de sua irmã, ainda bebé, comida por uma horda selvática de ratazanas), superou o trauma, que vitimaria socialmente seu pai e sua mãe, tornando-se o mais importante exterminador de roedores de toda a América Latina.
Por isso não espanta que, tendo "uma vez , um engenheiro agrónomo com pretensões de dietista, ousado dizer à sua frente que, dado a falta de gado no Peru, era necessário intensificar a criação de cobaias com vista à alimentação nacional", tenha recordado "ao atrevido que a cobaia era prima/irmã da ratazana".
Mas como este "reincidindo, recitou estatísticas, falou de virtudes nutritivas e da carne saborosa ao paladar", "o senhor Federico passou então a esbofeteá-lo até o dietista rolar pelo chão".

Estava em Lima e como já tinha comido ceviche peruano na véspera (declarado Património Cultural da Nação), prato de peixe e marisco crú num molho fortemente alimado, desafiei a minha guia a surpreender-me com outro extravagante petisco, daquela que é considerada uma das mais originais cozinhas do Mundo.
Prometeu levar-me a um restaurante popular em San Isidro, onde serviam o melhor cuy andino.
O ambiente era animado e enquanto se esperava o prato, foram-se bebendo uns Pisco Sour, cocktail nacional feito a partir de Pisco (aguardente de uva), sumo de limão, clara de ovo e canela. E esta alcoolemia introdutória salvou-me de uma má figura, quando me foi servida uma espécie de ratazana estaladiça, que de resto se veio a revelar deliciosa.
O Cuy era afinal o nosso porquinho da Índia ou cobaia e a que os ingleses chamam Guinea Pig.
Trata-se de um roedor domesticado há mais de 2000 anos pelas populações andinas pré hispânicas e que terá sido introduzido na Europa no sec. XVI pelos Espanhóis, onde foi apreciado como mascote e animal de estimação e nunca pelo seu potencial nutritivo.
Porém no Perú comem-se cerca de 65 milhões de cuys por ano, prática que foi reintroduzida a partir dos anos 60, e da qual o engenheiro agrónomo, personagem do folhetim de Pedro Camacho, terá sido um importante impulsionador.
À Tia Júlia e o Escrevedor  voltaremos mais tarde, mas lembro que já não foi com perplexidade, que alguns dias depois, na Catedral de Cusco, deparei com a ementa desta Última Ceia, da autoria de Marcos Zapata.

domingo, 7 de novembro de 2010

O Botas

Old Boots

Face à deceção que se generaliza, começam a ser frequentes alusões simpáticas e mesmo elogiosas ao ditador Oliveira Salazar, pelo seu eficaz controle das Finanças Públicas.
Surgem estas apreciações na sua maioria de jovens, muitas vezes economistas, que ao analisarem as séries das Finanças Públicas, verificam que o país só conseguiu escapar aos déficites Orçamentais, desde que este antigo seminarista e professor de Finanças Públicas ocupou essa pasta ministerial em 1928 - para em seguida se consagrar primeiro ministro em 1932, posto que só abandonou em 1968, na sequência de uma famosa queda de uma cadeira, que lhe terá provocado um hematoma cerebral, de que resultaram danos cerebrais importantes.
Comentários destes seriam inaceitáveis há dez anos atrás e nesse aspeto fico contente da superação desse tabu nacional - porém será importante, que a atual desgraça não nos leve a revisionismos históricos e nos façam desejar uma desgraça ainda maior.
O Botas, como lhe chamavam  alguns portugueses, foi um austerocrata, para quem efetivamente não havia mais vida para além do déficite. E se hoje, esse é justamente o problema que mais nos aflige, não deixemos que ele nos cegue e nos faça desejar alguém cujo (quase) único mérito foi esse.
Portugal em 1968 era um país muito próximo da Albânia de Enver Hoxha, sem Liberdade, sem Indústria, com indices sanitários (mortalidade infantil, esperança de vida) miseráveis, uma taxa de analfabetismo e um nível de vida degradantes, horizontes existenciais e culturais que esbarravam na fronteira com Espanha.
Os cofres cheios de ouro eram um delírio à Tio Patinhas, que rapidamente se esgotou, pois um povo é rico "se souber pescar, não por ter muito peixe" (e ainda por cima tendo muito fome ...)!
A baixa qualidade dos políticos que nos governam, também é consequência da falta de maturidade democrática da Sociedade, muitos anos habituada a desligar-se da discussão dos problemas e da sindicância dos seus dirigentes. Seremos sempre produto do nosso passado, embora não tenhamos que ser refém dele!

Estes comentários não se destinam a quem tenha nascido antes da década de 60, pois terá concerteza a sua opinião pessoal, resultado da sua própria experiência, que pode ser a oposta a esta e à mesma respeitável.
Em épocas de crise, a sociedade fica suscetível a arautos de quimeras e facilmente nos concentramos nos aspetos que agora mais nos afligem, secundarizando outros não menos importantes.
Teremos que viver uma época de grande austeridade, se queremos ultrapassar o fosso em que estamos, mas saibámo-lo fazer como um desígnio coletivo, uma prova, a superar, das nossas capacidades e saibamos resistir aos homens providenciais que inevitavelmente se irão perfilar como nossos salvadores.

sábado, 6 de novembro de 2010

Os fins justificam os meios?



Não será nenhuma originalidade refletir sobre o fim ou os cortes no Estado Social, mas há um aspeto que não tenho visto abordado nos múltiplos debates e artigos sobre o tema.
Quando se fala no corte de apoios, subsídios e acompanhamento das mais variadas desgraças, é natural que as pessoas, acordando em si os seus princípios humanitários, discordem. Mas o que ninguém sabe, nem consegue saber, é qual a percentagem dos custos alocados para solidariedade social que chega aos necessitados e a que é gasta na manutenção dessa estrutura. E quando ouço esses públicos lamentos, fico sem saber se têm origem no espírito misericordioso, ou se são motivados pela defesa de interesses de uma larga classe de técnicos que se tornaram dependentes desta sociedade assistencialista.
Vejamos: quantos milhares de assistentes sociais, técnicos de intervenção variada, psicólogos, gestores, motoristas, telefonistas, informáticos, asseguram o  seu rendimento de classe média, sob a necessidade de prestar assistência aos toxicodependentes, às prostitutas, às famílias disfuncionais, aos emigrantes, aos desalojados, às vítimas de violência doméstica, aos sem abrigo, aos sem rendimento, aos deserdados de toda espécie.
Não quero, nem por sombras, sugerir que estas pessoas que são atiradas para a margem da sociedade, não devam ser apoiadas e protegidas. Mas não tenho qualquer dúvida que o grosso dos recursos alocados a esta problemática, não chega, nem beneficia de qualquer forma, os que dela necessitam.
Desde logo pela sobreposição "cacofónica" de entidades - Segurança Social, Serviços socias das autarquias, dos Ministério da Justiça, Saúde, Educação, Cats, Cpcjs, múltiplas comissões dependentes desde a Presidência do Conselho de Ministros aos milhentos Institutos e Fundações, ONGs que de forma direta ou indireta comem à mesa do Estado, Linhas de Apoio Telefónico, Gabinetes de Crise.
E como sempre acontece quando muita gente trata da mesma coisa, uns passam para os outros, uns interpelam os outros, uns fiscalizam os outros e todos se justificam mutuamente, elencando de passagem mais não sei quantas estruturas ainda em falta e acabando por perder de vista o objeto da sua existência.
Toda esta multiplicação de organismos resultou da soma de boas vontades e intenções e da ausência de coordenação central, que á apanágio do nosso Estado. Surgiram para colmatar deficiências dos recursos existentes, sem que com isso se retirassem competências e meios aos organismos substituídos.
(E este tem sido o drama, inclusivamente das reformas "simplificadoras" encetadas - Criaram-se os Gabinetes do Cidadão, retirando-se movimento aos Registos Civis, Segurança Social, etc., sem que isso tenha motivado uma diminuição equivalente dos quadros dessas repartições, isto é, ao "simplificar-se", engordou-se o monstro.)

No atual quadro de inevitável corte de recursos, se isso se refletisse na diminuição de entidades, técnicos e procedimentos que se atrapalham no afã assistencial, seria possível que os destinatários, não sofressem uma alteração significativa dos meios disponibilizados para os socorrer. Mas infelizmente é o contrário que está e continuará(?) a acontecer - cortam-se nos abonos de família, nos subsídios, nos apois diretos aos necessitados, concentrando-se os recursos na manutenção da estrutura, cuja existência cada vez menos se justifica, já que cada vez mais terá menos para distribuir.
Este é o monstro autofágico que nos parasita!
Era um útil (e exigente) exercício para uma Universidade, um Instituto ou Fundação da área, tentar apurar realmente, que parte do Orçamento destinado ao Assistencialismo, chega concretamente aos necessitados. Não temos muito essa tradição de deitar contas à vida, mas teríamos de certeza uma muito grande surpresa.
Se não houver coragem para fazer um "back to the basics" - mantendo as estruturas centrais do Estado Assistencial, responsabilizando-as e obrigando-as a ser eficientes e eficazes e eliminando todos os  satélites em autogestão - então começo mesmo a pensar se não será melhor desmantelar toda a máquina, voltarmos à barbárie e começarmos de novo.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

LIBERDADE



     No topo de uma Avenida modernista, à qual autarcas zelosos e abastados, raparam as árvores frondosas, substituindo-as por azeitonas luminosas, a decorar uma enorme (frigid)eira granítica, surge uma das mais recentes praças do País.
Concebida por Fernando Távora, que também projetou os dois edifícios que a ladeiam, detém-se sobre o rio, ancorada num pórtico desenhado por José Rodrigues.
Amparada a nascente por uma irresistível peça arquitetónica de Siza Vieira e a poente por um recinto polivalente de Souto Moura (em construção), tem padrinhos e atributos que bastem para se tornar um fantástico local de bem estar e de bom gosto.
Falta ainda, a sua humanização - os edifícios de tão nobre linhagem, aguardam há anos que lhes seja atribuída uma função, a sua depurada linha, já foi utilizada na última romaria para implantar carrinhos elétricos e carroceis (tendo resultado fraturas significativas e nunca reparadas no pavimento) e não existem uns bancos ou outro equipamento, que permitam ao visitante deter-se e desfrutar (talvez para não concorrer com as esplanadas circundantes).

Mas o que me traz à praça, agora, é o nome - Liberdade.
Sinto no ar o tempo de todos os desvarios.
Berra-se em todo o lado, com e sem razão.
A confusão permitirá aos culpados escaparem incólumes - gritando tanto como os outros, em breve já ninguém perceberá quem foi o culpado.
E os mesmo reaparecerão, mais tarde, como providentes salvadores...
Mas o que eu agora temo, é que venham de novo tempos de trevas, em que o nome da praça se torne inconveniente e desapropriado!

Pior que ser pobre, é ser escravo!
Desfrutemos a brisa do rio, enquanto as agruras do Inverno, não nos afastem deste destino!