ESTOU PERDIDO, DEVO PARAR? NÃO SE PÁRAS ESTÁS PERDIDO! Goethe

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sábado, 9 de outubro de 2010

FUNCIONÁRIO PÚBLICO




Quando as pessoas falam de funcionário público, não se estão a referir ao médico que as consultou na semana anterior, à professora dos seus filhos, ao arquiteto que desenhou a praceta onde vivem ou ao veterinário que inspecionou a vitela para abater, que justamente lhe está a saber tão bem.
Isto independentemente de terem ficado satisfeitas com o trabalho destes profissionais - o que têm é a noção é que estes técnicos desenvolvem uma atividade útil e indispensável ao funcionamento da sociedade, tal como a entendemos, e que sem eles viveríamos noutro paradigma social.
Não, quando se fala do funcionário público, está-se a pensar no funcionário administrativo, aquele que recusou a consulta porque o cartão não estava em dia, que obrigou a preencher inúteis e inúmeros formulários, para a tramitação de qualquer processo, que não sabe justificar a razão de tantos procedimentos e que lá no fundo parece secretamente feliz por infernizar a vida aos seus concidadãos.
Funcionalismo Público, nas sinapses cerebrais, linka com "O Processo" de Kafka, para quem o leu e com "burocracia" para as pessoas em geral.
E a burocracia é uma realidade duplamente dispendiosa para uma sociedade: porque obriga em si a uma estrutura de recursos humanos, espaços físicos e despesas correntes (consumíveis,serviços,etc.) pesada e tendencialmente ilimitada, como gera custos de funcionamento social incalculáveis (atrasos, corrupção, concorrência desleal, consultoria, dificuldade de planificação, etc.).
E há ainda outro efeito preverso, poucas vezes falado, da burocracia (ou "funcionalismo público") - é a contaminação das tais actividades produtivas que o Estado desenvolve a bem de todos, pelo espírito de F.P.( curiosamente as iniciais dão tanto para Funcionário Público, como para Filho da Puta - escolham voçês o significante que mais vos aprouver).
E assim há médicos, enfermeiros, professores, engenheiros, economistas, arquitectos, varredores, calceteiros, agrónomos, jardineiros, que se tornaram verdadeiros F.P..
E esse será talvez o mais pernicioso dos efeitos - até porque são estes que dentro de uma estrutura altamente burocratizada têm tendência a ser mais bem sucedidos e a impor a sua perspectiva.
Perguntar-se-á, mas toda a actividade burocrática é inútil?
Não toda (aliás na sua essência é muito importante, porque permitiria o funcionamento sem sobressaltos da actividade assistencial), mas a partir dos mínimos indispensáveis, não só é inútil como estorva. Todos: os que trabalham para o Estado e os que é suposto usufruirem desse trabalho.
Quando se fala em encolher e diminuir os custos com o Estado, que julgo será um desejo quase universal, não estão os cidadãos a pensar ter menos professores, menos jardins, menos acesso à saúde ou à justiça. Sonham, penso eu, ver o Estado reduzido à sua função mais nobre e essencial, a deixar de invadir o privado de cada um para controlar e esbulhar, para complicar e emperrar. Um Estado menos burocrático e mais proximo das necessidades coletivas. E terão razão? Haverá ganhos significativos nessa Reforma? Creio que sim!
Tomemos um hospital: o aumento dos custos em recursos humanos nos últimos 15 anos foram enormes! A atividade assistencial também aumentou, mas se formos analisar para onde se canalisaram esses recursos , veremos que não foram nos operacionais (médicos,enfermeiros, alguns outros técnicos), mas numa caterva de atividades acessórias de controle, organização, planificação e atrapalhação em geral. Aumentaram o número de Administradores, de gestores de uma infinidade de níveis intermédios, que não param de se multiplicar, criaram-se gabinetes de apoio ao utente, de relações públicas, de estatística, jurídicos, serviços informáticos faraónicos, contratos de out sourcing sem tecto, para apoio a todas estas áreas entretanto criadas -  criou-se o monstro kafkiano. Pela contaminação da estrutura pelo espírito FP, mas também para servir como centro de emprego para as clientelas partidárias e dos caciques locais. Nenhum destes lugares foi ocupado por concurso público e até mesmo os médicos que até à meia dúzia de anos eram exclusivamente colocados por Concurso com provas públicas, passaram a sê-lo por convite e com condições contratuais (e portanto também remuneratórias), sem qualquer padrão.
O que faria você? Iniciava convicta e persistentemente um processo de regeneração do Sistema - a Reforma, com resultados que nalguns casos seriam imediatos, mas noutros demorariam anos? E se não vacilasse, ao fim de um mandato governativo teria um tecido mais são, mais produtivo, mais eficaz e menos caro.
Ou então, deixava tudo na mesma e reduzia o salário a todos os que trabalhassem para o Estado. Conseguiria dessa forma a mesma poupança, mas o que aconteceria à produtividade e eficácia? Os técnicos operacionais, aqueles que desenvolvem a actividade que tanto jeito lhe dá, sentir-se-ão desmotivados, traídos e injustiçados e terão a tentação de aderir ao espírito FP. Dessa forma a qualidade e a capacidade de resposta do Estado, diminuirá e entrará numa espiral de desagregação cada vez mais sem retorno. Será o trajecto anunciado do "barco a caminho do fundo".
E você perceberá então que foi enganado (porque chegou a entusiasmar-se com a ideia dos cortes cegos nos salários da FP - era a sua hora de vingança, compreende-se!), que viver numa sociedade sem capacidade para cuidar da saúde dos seus cidadãos, educar as suas crianças, planear as suas cidades, não era propriamente o seu sonho (e não falo nunca da Justiça, nem da Defesa, porque no primeiro caso, acho que já atingiu esse estado de falência, que desejo não se venha a estender aos outros setores e na Defesa, a Reforma consistiria precisamente em reduzir drásticamente os recursos, às reais necessidades do País).
Então reaja já! Não embarque nas receitas cegas e imediatistas dos mesmos que nos trouxeram até aqui! Não se deixe chantagear, com esse novo slogan bacôco da Ditadura dos Mercados Soberanos.

Sejamos por uma vez senhores do nosso destino! Antes que nos ocupem a jangada!

3 comentários:

  1. Mas, quem comanda o Navio? talvez o Fellini !!!

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  2. Si, la nave va!
    Bem visto!
    Se houver uma insurreição, fica em autogestão e certamente afundar-se-á!
    Se não houver, comanda o FMI!
    O Fellini seria uma boa hipótese, até porque o cenário será cada vez mais ao seu gosto!
    Confesso que sempre sonhei ser figurante da Cinnecittá!

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  3. Só que, como tudo na vida, a estrutura do Cinecittá foi privatizada ! Hoje...digitaliza !

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