O Sr. Federico Téllez Unzategui, "estava na flor da idade, nos cinquenta e os seus sinais particulares - fronte larga, nariz aquilino, olhar penetrante, retidão e bondade de espírito", tinham-lhe permitido atingir o sucesso à frente da firma Anti-Roedores, S.A..
Embora nada faça crer que conhecesse a Drª Lucía Acémila ("mulher superior e sem complexos, chegada ao que a ciência deu em considerar a idade ideal - os cinquenta - apresentava fronte larga, nariz aquilino, olhar penetrante, retidão e bondade de espírito"), tinha superado os traumas de uma infância difícil, seguindo intuitivamente o método que tanta fama viria a dar a esta facultativa - não havia vantagem em superar as preversões e os complexos, bastava assumi-los e fazer disso uma vantagem.
E assim Federico Téllez Unzategui, com uma vida potencialmente destruída pela culpa associada a um episódio da sua infância (a morte de sua irmã, ainda bebé, comida por uma horda selvática de ratazanas), superou o trauma, que vitimaria socialmente seu pai e sua mãe, tornando-se o mais importante exterminador de roedores de toda a América Latina. Por isso não espanta que, tendo "uma vez , um engenheiro agrónomo com pretensões de dietista, ousado dizer à sua frente que, dado a falta de gado no Peru, era necessário intensificar a criação de cobaias com vista à alimentação nacional", tenha recordado "ao atrevido que a cobaia era prima/irmã da ratazana".
Mas como este "reincidindo, recitou estatísticas, falou de virtudes nutritivas e da carne saborosa ao paladar", "o senhor Federico passou então a esbofeteá-lo até o dietista rolar pelo chão".
Estava em Lima e como já tinha comido ceviche peruano na véspera (declarado Património Cultural da Nação), prato de peixe e marisco crú num molho fortemente alimado, desafiei a minha guia a surpreender-me com outro extravagante petisco, daquela que é considerada uma das mais originais cozinhas do Mundo.
Prometeu levar-me a um restaurante popular em San Isidro, onde serviam o melhor cuy andino.
O ambiente era animado e enquanto se esperava o prato, foram-se bebendo uns Pisco Sour, cocktail nacional feito a partir de Pisco (aguardente de uva), sumo de limão, clara de ovo e canela. E esta alcoolemia introdutória salvou-me de uma má figura, quando me foi servida uma espécie de ratazana estaladiça, que de resto se veio a revelar deliciosa.
O Cuy era afinal o nosso porquinho da Índia ou cobaia e a que os ingleses chamam Guinea Pig.
Trata-se de um roedor domesticado há mais de 2000 anos pelas populações andinas pré hispânicas e que terá sido introduzido na Europa no sec. XVI pelos Espanhóis, onde foi apreciado como mascote e animal de estimação e nunca pelo seu potencial nutritivo.
Porém no Perú comem-se cerca de 65 milhões de cuys por ano, prática que foi reintroduzida a partir dos anos 60, e da qual o engenheiro agrónomo, personagem do folhetim de Pedro Camacho, terá sido um importante impulsionador.
À Tia Júlia e o Escrevedor voltaremos mais tarde, mas lembro que já não foi com perplexidade, que alguns dias depois, na Catedral de Cusco, deparei com a ementa desta Última Ceia, da autoria de Marcos Zapata.
Assim como está no prato, com orelhinhas e tudo, dava para parar uns segundos. Mas descabeçado e bem temperado, chamava-lhe ... um figo!
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