ESTOU PERDIDO, DEVO PARAR? NÃO SE PÁRAS ESTÁS PERDIDO! Goethe

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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Complexo de Portnoy



“Ela estava tão profundamente entranhada em minha consciência que, no primeiro ano na escola, eu tinha a impressão de que todas as professoras eram minha mãe disfarçada. Assim que tocava o sinal ao final das aulas, eu voltava correndo para casa, na esperança de chegar ao apartamento em que morávamos antes que ela tivesse tempo de se transformar. Invariavelmente ela já estava na cozinha quando eu chegava, preparando leite com biscoitos para mim. No entanto, em vez de me livrar dessas ilusões, essa proeza só fazia crescer minha admiração pelos poderes dela. Além do mais, era sempre um alívio não surpreendê-la entre uma e outra transformação – muito embora eu jamais deixasse de tentar; eu sabia que meu pai e minha irmã nem faziam ideia da natureza real de minha mãe, e o peso da traição que, imaginava eu, recairia sobre meus ombros se alguma vez a pegasse desprevenida seria demais para mim, aos cinco ano de idade.”

Assim começa o Complexo de Portnoy de 1969, terceiro livro de Philip Roth.
Monólogo de um judeu de trinta e tal anos no consultótrio do psicanalista, é um livro dotado de uma profusa ironia, envolta numa linguagem desbragada e escatológica, que nos leva amiúde ao riso (fácil!).
Roth, que tem a sua obra fortemente alicerçada nas suas memórias autobiográficas (como de resto explicitou em "The Facts - a novelist autobiography" de 1988), transporta-nos aqui para um universo neurótico, que remete para o de Woody Allen - a auto-ironia, as obsessões sexuais, a culpa omnipresente da moral judaica, o ambiente novaiorquino (em Roth, o espaço geográfico de Newark-New Jersey, da sua infância, é o cenário priveligiado da sua obra!).

 De Roth já tinha lido "Conspiração contra a América" (2004), livro que me encantou pela forma notável como desenvolve uma ficção histórica improvável e pela maestria da escrita.
Neste "Portnoy´s Complaint", 35 anos mais antigo, venho encontrar muita coisa em comum - o contexto geográfico e sociológico da história, as suas obsessões pela origem judaica, a observação do Mundo através duns olhos infanto-adolescentes.

Tive oportunidade na minha juventude, de viver algumas semanas na casa de uma família judia novaiorquina. Nunca pensei que o peso da história e da tradição pudessem marcar tanto alguém, como percebi ser o caso dos judeus. Não houve serão que não tivesse uma preleção sobre costumes ou a história sionista, visita que não fosse condicionada por essa perspetiva religiosa, mesmo tratando-se duma família pouco praticante, em que os filhos jovens não frequentavam a sinagoga e a esposa se recusava a viver confinada aos clubes sociais da comunidade judia.
Desde aí percebi melhor o forte condicionamento mental, a doentia noção de dever e pecado, que marca este povo.
Portnoy que recusa a religião que lhe saiu no berço, não conseguiu contudo escapar a um fortíssimo complexo de Édipo que lhe saiu no leite - e não esqueçamos que foi outro eloquente judeu, que descreveu cerca de 70 anos antes, este quadro pela primeira vez, embora com menos graça!

Este é o livro do mês do Clube de Leitura, estando este espaço aberto, através dos comentários, às observações que queiram aportar à discussão.
 Boa leitura! ( AQUI, pode fazer o download gratuito do livro!)

2 comentários:

  1. Apesar de ter linkado, cheio de boa vontade, uma versão Pdf do livro, pessoa amiga fez-me chegar informação de se tratar de tradução brasileira de qualidade duvidosa!
    Confrontado o texto com o da recente (2010) tradução portuguesa, parece tratar-se de outro livro, vulgar e sem graça.
    Portanto não recomendo a leitura dessa versão a ninguém.

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