ESTOU PERDIDO, DEVO PARAR? NÃO SE PÁRAS ESTÁS PERDIDO! Goethe

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sexta-feira, 8 de abril de 2011

A Cidade e As Serras



Publicado em 1901, um ano após a morte de Eça de Queiroz, que não terminou sequer a revisão do manuscrito, A Cidade e as Serras é um livro divertido, muito ideológico e que mantém uma enorme actualidade (isto é, é intemporal, como toda a grande literatura!).

De todos os livros do Eça que em tempos li, era aquele do qual guardava uma imagem mais nítida e a impressão de mais ter influenciado a minha visão do Mundo.

A perspectiva mordaz sobre a civilização que constitui a primeira metade do livro, é muito próxima da que reaparece em Playtime (1967) de Jacques Tati - uma sociedade obcecada pela novidade, pelos gadgets tecnológicos e pelo formal em geral, mas desencantada e vazia de valores e objectivos concretos.
Eça de Queiroz contrapõe na segunda parte um romantismo bucólico, de exaltação da vida simples e natural do campo (neste caso, o Douro), ambiente em que Jacinto desabrocha para a realidade da vida (planta as árvores e tem os filhos!), conduzido pela amizade do seu companheiro serrano, Zé Fernandes.

Paris, retratado como o farol de uma civilização que só valoriza o lucro e o prazer, aparece como a quimera enganadora, enquanto a as rústicas terras de Tormes são descritas como uma bênção divina.
É um Eça de Queiroz culto, cosmopolita, que já tudo viu, leu e criticou, aparentemente reconciliado consigo mesmo e com o seu país, este que transplanta um sofisticado e enfastiado Jacinto, de Paris para os xistos durienses e o deixa feliz na sua pele de iluminado aristocrata, a exercer um humanismo caritativo.

Livro sobre o tédio do excesso - de bens, de informação, de tecnologia - é muito oportuno para uma geração (que inadequadamente chamam de rasca) que cresceu sem ter de enfrentar dificuldades materiais, de lutar pela sua liberdade, com acesso a conhecimento e informação nunca antes existentes e que parece tal como Jacinto enfastiada, sem motivação e que se vê no limiar de uma situação nova para a qual não estava preparada.

A única diferença é que não disporá dos "cento e nove contos de renda em terras de semeadura, de vinhedo, de cortiça e de olival" de Jacinto, que lhe permitiram a sua diletância de socialista idealista.

2 comentários:

  1. Não sou propriamente um entusiasta da literatura do Eça. Foi um escritor com muito talento, e muito completo. Mas nas suas obra falta qualquer coisa. Não sei.
    Entao a última obra que consegui ler dele foi dos mais fastidiosos livros que li.

    Ainda assim o tardio A Cidade e as Serras foi o que mais gosto me deu ler.

    O episódio do elevador e da pesca do peixe é inesquecível.

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  2. É impressionante as discrições das paisagens nesta obra, parece que as estamos a vê-las.
    Não deixa de ser curioso como muitos anos após a publicação desta obra, estudos apontam que nas sociedades desenvolvidas além de as pessoas viveram com muito mais luxos, são muito menos felizes do que nas sociedades menos desenvolvidas, é impressionante a quantidade de pessoas que no ocidente tomam anti-depresivos. Neste ponto, Eça estava 100 anos a frente desses estudos.

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